quarta-feira, 7 de março de 2007

Satélite Bacana

Os Satélites Artificiais (não tripulados)

Velho sonho perseguido por geniais sonhadores como Júlio Verne, Hermann Oberth, Konstantin Tsiolkovsky e grandes construtores, como Robert Goddard, Wernher von Braun e Sergei Korolev, o satélite artificial finalmente se materializou no dia 4 de outubro de 1957, com o lançamento, na União Soviética, do Sputnik 1, pequena esfera de alumínio com alguns medidores e transmissores de rádio. A União Soviética manteve a primazia nos primeiros tempos da corrida espacial, lançando o Sputnik 2, com a cadelinha Laika, em 3 de novembro do mesmo ano. Já em 31 de janeiro de 1958, os Estados Unidos conseguiram lançar o seu primeiro satélite, o Explorer 1, responsável pela descoberta do cinturão radioativo de Van Allen. Seguiram-se mais Explorers e Vanguards americanos e mais Sputniks soviéticos, e assim por diante. Estava aberto o caminho. Enquanto persistiam no desbravamento da atmosfera terrestre e seus arredores, os cientistas soviéticos e americanos também começavam a arriscar suas primeiras tentativas de lançar satélites rumo à Lua. A soviética Luna 1, lançada em 2 de janeiro de 1959, embora não tenha acertado o caminho da Lua, foi a primeira sonda lunar. A Luna 3 enviou a primeira fotografia do lado oculto da Lua, em outubro de 1959 (apenas 2 anos após o lançamento do Sputnik 1). A Pioneer 4, lançada em 3 de março de 1959, foi o primeiro satélite americano a escapar da gravidade terrestre. Passou a 60.000 km da Lua, semanas após a Luna 1 russa também ter errado a Lua (por 5.000 km); porém, não transmitiu nenhuma informação relevante. Nesta época, já os primeiros satélites militares eram lançados, com o objetivo de efetuar o reconhecimento fotográfico do território inimigo. As duas grandes potências desenvolviam e testavam ICBMs (Intercontinental Balistical Missiles) capazes de carregar ogivas nucleares. Os norte-americanos ativavam seu projeto ultra-secreto KH-1, que contava com os satélites Discoverer (o Discoverer 1 foi lançado em 28 de fevereiro de 1959). Em 18 de agosto de 1960 o satélite Discoverer 14 subiu equipado com a primeira câmara fotográfica Corona. Apenas em 11 de dezembro de 1961 os soviéticos tentaram lançar, sem sucesso, o satélite espião Zenit 1. No dia seguinte, 12 de dezembro, os americanos lançaram o Discoverer 36, que já fazia parte do projeto KH-3. Em 1 de abril de 1960 os norte-americanos lançaram seu primeiro satélite meteorológico bem sucedido, o Tiros 1, e em 10 de julho de 1962 lançaram o primeiro satélite de comunicações, o Telstar 1. Além de outras sondas com destino à Lua (como as americanas Ranger, Surveyor e Lunar Orbiter), também os planetas Vênus e Marte passaram a ser alvo da corrida espacial. As naves soviéticas das séries Mars (a partir de outubro de 1960) e Venera (a partir de fevereiro de 1961) e algumas norte-americanas Pioneer (a partir de março de 1960) e Mariner (a partir de julho de 1962) desempenharam importantíssimo papel na descoberta das características dos planetas nossos vizinhos e seu espaço circundante, bem como do Sol. Em 15 de setembro de 1968 os soviéticos lançaram a nave Zond 5 (na realidade, uma cápsula Soyuz automática), o primeiro artefato humano a orbitar a Lua e retornar à Terra. Outros feitos dignos de nota ocorreram após o pouso da Apollo 11 na Lua (21 de julho de 1969): a sonda soviética Luna 16, lançada em 12 de setembro de 1970, pousou na Lua e trouxe cerca de 100 gramas de solo lunar de volta para a Terra, fato repetido posteriormente pelas sondas Luna 20 e Luna 24. A nave Luna 17, lançada em 10 de novembro de 1970, carregava o robô automático Lunokhod 1, equipado com câmaras de televisão (extremamente nítidas) e diversos instrumentos científicos destinados a analisar o solo lunar. A Luna 21, lançada em 8 de janeiro de 1973, carregava o Lunokhod 2, uma versão ligeiramente mais evoluída. Também Mercúrio foi visitado por uma sonda, a Mariner 10, entre março de 1974 e março de 1975. Novas gerações de sondas planetárias se sucederam, como as americanas Viking a partir de agosto de 1975) e Voyager (a partir de setembro de 1977) e as soviéticas Prognoz (abril de 1972 a agosto de 1996), VeGa (dezembro de 1984) e Phobos (julho de 1988), as sondas japonesas Sakigake e Suisei (janeiro e agosto de 1985), a sonda da Agência Espacial Européia, Giotto (julho de 1985), as americanas Lunar Prospector (julho de 1988), Galileo (outubro de 1989) e Mars Pathfinder (1995) com seu robô-miniatura Sojourner. Os alvos: Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno, o Sol e diversos cometas. Ainda merece um grande destaque o Telescópio Espacial Hubble, lançado em 24 de abril de 1990, e que apresentou sérios problemas no início da sua vida útil mas que posteriormente foi consertado por astronautas americanos, em dezembro de 1993. Tipos de Satélites Podemos dividir os satélites artificiais em 2 grandes grupos, segundo a sua aplicação: civis e militares. Os satélites de uso civil têm objetivos pacíficos: descobertas científicas, teste de novas tecnologias, levantamento de recursos naturais, auxílio a tarefas diversas que, sem eles, seriam dificilmente realizáveis. Já os satélites de uso militar, cujo auge ocorreu durante a Guerra Fria, objetivam espionar e intimidar o inimigo. Antes da queda da União Soviética, os blocos ideológicos estavam bem definidos, e todos sabiam a quem deveriam vigiar. Nos dias de hoje, quando esta divisão em blocos não é bem clara, a tendência é que aqueles países que detêm a tecnologia e os recursos financeiros necessários para uma tarefa deste porte acabem por desconfiar e espionar todo o resto da humanidade. Satélites - Aplicação civil As principais aplicações civis dos satélites artificiais se dividem em: Testes biológicos Era muito comum, no início da Era Espacial, o uso de satélites ou mesmo de cápsulas espaciais carregados de pulgas, aranhas, girinos e outros representantes de uma fauna menos "nobre". Não se tinha nenhuma idéia de quais poderiam ser os efeitos que um vôo espacial poderia ter sobre os animais. Após os testes iniciais bem sucedidos, começaram a ser enviados animais mais "nobres", como cães (preferidos pelos soviéticos, como ocorreu com a famosa cadelinha "Laika", a bordo do Sputnik 2, em 3 de novembro de 1957, e com outros caninos, nem sempre sobreviventes, em alguns satélites da série Kosmos e mesmo em naves Zond) e macacos (preferidos pelos americanos, como foi o caso de um chimpanzé de 17 quilos chamado Ham, lançado a bordo do Mercury Redstone 2, em 31 de janeiro de 1961). Com o advento das estações espaciais, os testes biológicos deixaram os apertados satélites e foram transferidos para laboratórios espaciais tripulados, com melhores condições de controle das experiências. Pesquisa de recursos naturais As aplicações dos satélites de pesquisa de recursos naturais englobam uma série muito grande de possibilidades, tais como: 1. detecção e estudo dos cinturões radioativos de Van Allen, geodésia, pesquisa do geomagnetismo, atmosfera superior, ionosfera, micrometeoritos e ambiente interplanetário próximo (Vanguard, Sputnik 3, satélites da série Explorer, Prognoz e dezenas de outros projetos de diversos países); 2. mapeamento de recursos minerais via fotografia, radar, gravimetria, raios infravermelhos e outros (Landsat); 3. pesquisa de recursos biológicos, terrestres, atmosféricos, oceanográficos (Geosat, Radarsat , Seasat). Sondas planetárias Sem dúvida, as sondas planetárias são os satélites que mais atenção provocam no público em geral. As sondas podem ser divididas em 3 tipos: 1. sonda passiva - sonda que apenas cumpre uma trajetória balística, em condições de interferir no seu vôo. São, via de regra, as sondas mais antigas, como as primeiras Luna e as primeiras Pioneer, cujo objetivo era entrar em órbita da Lua ou chocar-se contra ela; 2. sonda controlada - sonda com algum tipo de controle, que lhe permite mudanças orbitais controladas, às vezes visando um choque contra o alvo; tipicamente as sondas Ranger e algumas Luna, bem como as séries Lunar Orbiter, Mariner, Voyager, as sondas européias Giotto e Ulysses e as japonesas Sakigake e Suisei; 3. sonda com módulo de pouso - sondas capazes de entrar em órbita e liberar um módulo de pouso suave (sondas Surveyor, Viking, Luna 9 e outras, Mars, Venera, VeGa, Phobos, Galileo. Em alguns casos, este módulo de pouso era capaz de retornar à Terra com amostras de solo (lunar, no caso da Luna 16 e outras); 4. sonda com robô móvel - sondas capazes de entrar em órbita e liberar um módulo de pouso suave, o qual contém um veículo tele-guiado. É o caso clássico dos robôs soviéticos Lunokhod 1 (Luna 17) e Lunokhod 2 (Luna 21), bem como o robô Sojourner (Mars Pathfinder). As sondas planetárias também podem ser divididas quanto ao seu destino: Sol (Prognoz, Ulysses), Lua (Luna, Lunar Orbiter, Pioneer), Marte (Mars, Mariner), Vênus (Venera, Pioneer 12, Pioneer 13), Mercúrio ( Mariner 10), Júpiter e Saturno (Voyager), cometas (Sakigake e Suisei, VeGa) e espaço profundo (Voyager). Astronomia e observatórios orbitais Por causa da interferência da atmosfera, sujeita a ventos, umidade, núvens e chuvas, a utilização de observatórios astronômicos na Terra sempre apresentou problemas de indisponibilidade, distorção, etc. A captação de radiação infravermelha, especificamente, enfrenta limitações muito sérias. Por este motivo, foi praticamente inevitável a construção de observatórios orbitais e satélites com outras finalidades astronômicas. Como exemplo, cite-se: Hipparcos (raios infravermelhos), Hubble (telescópio óptico), Chandra (raios-X). Meteorológicos A previsão meteorológica sempre foi fundamental para a humanidade: desde a agricultura até as invasões militares, passando por atividades bem mais amenas, como a marcação do melhor período de férias. Somente a partir do espaço é possível observar, de forma regular e sistemática, a maior parte da superfície do nosso planeta. Os complexos e sofisticados sensores dos satélites meteorológicos atuais permitem estabelecer um panorama geral da distribuição das nuvens, estudar as correntes marítimas nos oceanos, acompanhar os principais processos atmosféricos, verificar o nível da irradiação térmica da Terra para o espaço, detectar a formação de furacões, etc. Já no início dos anos 60, estavam operacionais os primeiros satélites meteorológicos, por exemplo as séries TIROS, Meteor e Nimbus (foto ao lado). Devido a um acordo internacional firmado em 26 de março de 1969, data do lançamento do satélite soviético Meteor 1, todas as nações trocam entre si os dados obtidos dos satélites meteorológicos (para uso civil, claro!) Telecomunicação Outra aplicação fundamental, tanto para uso civil quanto militar, são as telecomunicações. As primeiras tentativas foram realizadas com satélites passivos, como o norte-americano Echo (1960), que nada mais era do que um balão de plástico e alumínio, de 30 metros de diâmetro, lançado numa órbita circular de baixa altitude. Seguiram-se projetos mais elaborados (os norte-americanos Telstar, Relay, Intelsat, Syncom e outros, e os russos da série Molniya e Gorizont). Muitos países desenvolveram e lançaram seus próprios satélites de telecomunicações, inclusive o Brasil, com o Brasilsat. Dentro das telecomunicações encontram-se, igualmente, os satélites destinados à telefonia celular. Diversos projetos foram e estão sendo elaborados com este objetivo, como o Globalstar (48 satélites), o Spaceway, o Teledisc (840 satélites) e o falido Iridium (66 satélites). Também há outras aplicações, dentro das telecomunicações, como os satélites para radioamadorismo (por exemplo, o Oscar). Navegação O objetivo dos satélites de navegação é fornecer, com grande precisão, a posição (coordenadas) de equipamentos móveis (instalados em navios, aviões, carros ou mesmo computadores portáteis). É óbvio que esta é uma aplicação primordialmente militar, mas que acabou se estendendo à vida civil por absoluta necessidade e pela grande oportunidade de negócio. Existem dois tipos de satélites de navegação: os de localização (mais antigos, exigem que o usuário emita um sinal, que pode ser detectado por qualquer dispositivo espião - portanto, inútil para aplicações militares), e os de posicionamento (permitem que o usuário, situado em qualquer ponto do planeta, defina sua posição sem a necessidade de emitir qualquer sinal, o que é adequado para aplicações militares). O primeiro projeto de navegação operacional foi o norte-americano Transit, utilizado inicialmente para fins exclusivamente militares, e posteriormente liberado para fins civis. Atualmente, tanto o americano GPS quanto o soviético Glonass - Global Navegation Satellite System, ambos sistemas de posicionamento, estão operacionais e disponíveis para uso civil. Experimentais Uma aplicação interessante para os satélites é a experimentação de novas tecnologias. Os soviéticos usaram e abusaram da série Kosmos com esta finalidade. Recentemente, os americanos lançaram as duas sondas Deep Space, cujo objetivo mais importantte era justamente o teste de novas tecnologias. Outros usos Existe uma grande quantidade de outras aplicações para os satélites civis, tais como salvamento, teledetecção, rastreamento, etc. Há mesmo um uso que pode ser considerado, no mínimo, exótico: satélites fúnebres, que carregam as cinzas de pessoas cremadas (ex.: Celestis). Satélites - Aplicação militar Vigilância O desejo de espionar o inimigo é anterior ao vôo do primeiro Sputnik. A Guerra Fria serviu de pretexto para os Estados Unidos desenvolverem aviões espiões, como o U-2 (1956) e, posteriormente, o SR-71 (1965), bem como satélites espiões. Em 28 de fevereiro de 1959 os Estados Unidos inauguraram o uso militar do espaço, com o lançamento do satélite espião de reconhecimento fotográfico Discoverer 1, dentro do Programa Key Hole. O satélite descrevia uma órbita polar, o que lhe permitia investigar toda a superfície da Terra. Tinha impressionantes 618 quilos, um peso absurdo se comparado com os outros satélites e sondas americanos da época. Foi utilizada a Base Militar de Vandenberg (somente empregada com fins militares). Outros satélites espiões foram se juntar aos muitos Discoverer neste início da militarização do espaço: Samos (câmaras de televisão), Midas (sensores de raios infravermelhos) e Vela (detecção de explosões nucleares). Os soviéticos respondiam com o Programa Zenit, que utilizou naves modificadas (não tripuladas) das séries Vostok (diagrama ao lado) e Voskhod, inseridas dentro da série Kosmos. No total, a série Zenit foi responsável por 660 lançamentos, sendo 614 bem sucedidos. Ao longo do tempo, também foram utilizados satélites Tsyklon e outros. Convém lembrar ainda o Programa Almaz, que foi uma sofisticada iniciativa soviética de vigilância militar, envolvendo missões tripuladas Soyuz em estações espaciais da série Salyut. Genericamente, os satélites militares de vigilância podem ser divididos em: 1. Satélites de Fotoreconhecimento e Mapeamento Topográfico 2. Satélites de Inteligência Eletrônica (ELINT) 3. Satélites de Reconhecimento Oceânico (detecção de subamarinos) 4. Satélites de Alerta Antecipado (detecção do disparo de mísseis com intenções bélicas) Ataque contra alvos orbitais, aéreos e terrestres Tanto soviéticos quanto americanos, durante a Guerra Fria, levaram muito a sério a possibilidade de um ataque nuclear vindo do espaço. Ainda nos anos 60 e 70, o esforço no projeto de naves de ataque foi relevante. Para tanto, foram projetados (e, em parte, construídos) satélites e naves capazes de atacar alvos orbitais ou terrestres (basta ver o projeto Istrebitel Sputnik, o ASAT soviético, de meados dos anos 60). Mesmo em tempos mais recentes, os soviéticos, por exemplo, sempre encararam o ônibus espacial norte-americano como uma ameaça militar, no que não estavam totalmente errados. Em meados dos anos 80 o governo norte-americano criou a paranóia militar chamada "Star Wars", que deveria ser um escudo protetivo contra mísseis lançados de qualquer parte do mundo. É óbvio que os soviéticos perceberam que este projeto não visava apenas a construção de armamento defensivo, mas também tinha intenções ofensivas. Assim, enquanto a diplomacia soviética exigia um tratado proibindo a militarização do espaço, os projetistas não perdiam tempo, e elaboraram um "Star Wars" soviético, com naves de ataque capazes de lançar mísseis inteligentes ou raios laser de alta potência. Chegaram a realizar, em 1987, um teste de uma nave de combate dotada de um canhão para auto-defesa e capaz de lançar minas nucleares, chamada de Polyus. Felizmente o teste foi mal sucedido, e a nave repousa calmamente sob as águas do Pacífico...


História da Conquista Espacial © Karl H. Benz